28 fevereiro 2011

Uma garota californiana em Milao


O primeiro show a gente nunca esquece… O meu, pelo menos, eu nao esqueci. Tirando um do Bozo que vi quando era bem pequeno, com meu pai numa praça perto de casa, um show mesmo, de verdade, que considero como o meu primeiro, foi um do Ira!, que minha minha irma ajudou a organizar. Fora o fato de que eu assisti o show do palco, nao curti muito: o pessoal queria invadir o palco, nao tinha segurança suficiente, eu nao conhecia quase nenhuma musica… Enfim, foi minha primeira experiencia com o show business. E que experiencia!

Mas nao estou aqui para falar do Ira!. Quero falar de primeiros shows. E na semana passada fui no meu primeiro show aqui em Milao. Katy Perry. Foi a primeira vez dela na Italia e a segunda apresentaçao da sua mais nova turne, “California Girls Tour”, baseado no seu ultimo CD, “Teenage Dream”, lançado no ano passado.

Comprei o ingresso ano passado, em novembro, e eles esgotaram das bilheterias. Também pudera: Katy Perry emplacou, nos ultimos meses, tres singles em todas as radios, inclusive aqui na Italia, dois dos quais tocam incansavelmente ate agora, “Teenage Dream” e “Firework”, cujo clipe è sensacional (a menina gordinha feliz na piscina e os fogos saindo do peito de Katy sao impagaveis). Alias, “Firework” tem uma pegada dançante otima, uma explosao que empolga qualquer um, bem no ritmo de seu titulo. Ja “Teenage Dream”, com sua letra provocante, fala diretamente da e para a meninada.

O show foi impecavel, todo coreografado, com bailarinos e uma historinha, que lembrava um pouco a de “Alice no Pais das Maravilhas”. Na versao de Katy, ela é uma menina que trabalha num açougue com um chefe mal e se apaixonava pelo padeiro. A noite, ao se deitar e dormir, começa a sonhar o tal “Teenage Dream”. Seu gato foge pela janela e ela , ao correr atras, cai em um mundo paralelo. E neste mundo rolam algumas situações enquanto ela procura seu gatinho, sendo as desculpas para encaixar as musicas.

Katy começou seu show cantando “Teenage Dream”, seguido por milhares de vozes adolescentes e estridentes que lotaram o ginasio com seus cartazes, faixas, perucas azuis, verdes e rosas, e orelhas de gatinho piscantes. As vezes, era possivel achar que voce tinha ido ver algum show de uma estrela da Disney, e nao de Katy Perry, que surgiu no mundo pop cantando musicas com letras um tanto polemicas, onde tinha beijado uma garota ou que chamava seu namorado de gay por ele se importar com a aparencia muito mais do que ela.

O show tem mais musicas do ultimo CD do que o do primeiro, “One of the boys”, lançado em 2008. Ao começar a cantar “I kissed a girl” numa roupagem mais intimista, fiquei decepcionado, pois a melodia original possui uma força incrivel, que queria prova-la ao vivo. Por sabia decisao, e para minha sorte, a tal versao intimista nao sobrevive a musica inteira, que se transforma na metade, dando lugar a guitarras e baterias. Ufa…

Por falar em intimista, o meio do show foi marcado por um momento voz e violao onde, além de se auto-declarar uma nerd, canta a musica de Rhianna “Only girl (in the world)” e também o neo-sucesso de Willow Smith, filha do Will Smith, “Whip my hair”. Novamente, a meninada surta, obviamente. Uma boa decisao para agradar mais ainda os presentes.

Uma das musicas que mais gosto de Katy è “Hot’n’Cold” , do primeiro CD. O clipe è engraçado, a letra è divertida e a melodia è pulsante, curto muito. Por isso, era uma das musicas que eu mais queria ouvir. E quando ela chegou, exatamente igual ao CD (ainda bem!), veio junto uma surpresa. Logo no começo da musica, Katy canta “You change your mind like a girl changes clothes”. Usando isso como deixa, ela deve ter se inspirado na comissao de frente do desfile da Unidos da Tijuca de 2010 e usou aquele truque de trocar de roupas “instantaneamente”. Quem nao se lembra do que eu estou falando, veja este video. Katy entrava num tunel de um lado e saia do outro com um vestido diferente. Ate aquela cabine que o pessoal da Unidos da Tijuca usou, que puxava uma cortina pra cima, era igual. E, com isso, Katy Perry trocou, em cima do palco, diversas vezes de roupas – eu perdi as contas. Isso durante apenas uma musica! E o resultado foi o esperado, o publico espantado com aquela “magica”. Novidade para eles, nem tanto para nos brasileiros. Mas ficou bem encaixado no show. Boa ideia!

A apresentaçao seguiu e terminou por volta das 23h com ela cantando “Firework” e “California Girls”. Confesso que eu esperava que houvesse algum espetaculo com fogos no palco na hora de “Firework”, mas nada. Uma comida de bola da produçao, que poderia ter causado um impacto grande, copiando a ideia do clipe. Mas o show foi bom, valeu a pena ter ido, mesmo eu nao estando muito no clima por conta dos ultimos acontecimentos.

Sobre a minha experiencia mesmo, alguns pontos positivos e outros negativos. Primeiro, descobri um dia antes, sem querer, que a organizaçao do show (Live Nation) tinha mudado o local do show. Como nao estava por aqui, eu nao sabia. Quase fui para a casa de show errada… Nunca vi isso de mudar local de show. A desculpa foi que a procura foi maior. Por sorte, o novo lugar, chamado Mediolanum Forum, numa cidade vizinha de Milao chamada Assago, ganhou uma estaçao do metro no ultimo sabado. Assim, foi um dos shows mais faceis de se chegar que eu ja fui na vida.

Ao chegar la, momento de raiva: no meu ingresso marcava lugar unico. Ok, fui feliz para a pista. Barrado. Havia outros tipos de ingresso. Detalhe que quando eu comprei so havia posto unico, nenhum outro tipo de ingresso. Como assim, outros tipos? Um italiano ficou batendo boca com o tal segurança. Eu resolvi ficar na minha e fui, com minha esposa, pra uma grade, la na arquibancada, ver o show. Apesar da distancia, era um bom lugar.

Os italianos sao empolgados vendo show. Nao gritam e pulam como nos brasileiros, mas sao empolgados. Participam da coisa. Levantam as maos, cantam, batem palma. Uma energia legal. Depois, voltei pra casa, de metro tambem. Antes da meia noite, ja estava na cama. Nada mal para um show em plena quarta-feira.

Enfim, valeu a pena. Divertido, um pouco infantil, tudo bem, mas que cumpriu o que prometeu. Dava pra levar tranquilamente minhas sobrinhas. Alias, o numero de familias presentes era imenso, muitos pais e maes com suas crianças. E as perucas, ah, as perucas. Foi engraçado ver o povo de cabelo rosa, azul e verde no metro. Quase um Carnaval.

Katy Perry tem show confirmado nesta ano no Brasil no Rock in Rio, na mesma noite de Rhianna. Quem puder ir, va. Eu recomendo.

24 fevereiro 2011

Minha linda Olinda

Minha avó morreu na última terça-feira, dia 22. Talvez, para alguns, um fato como este não signifique muita coisa. Para mim, significou, já que há muito tempo não perdia alguém que eu amava de verdade. Perdi meus dois avôs cedo, restando apenas as representantes femininas desta parte da família como referência. Uma, mãe da minha mãe, mora numa cidade do interior. A outra, mãe do meu pai, sempre morou mais perto – nos últimos anos, muito perto, na mesma rua que meus pais. E foi esta que se foi.

Muito por causa desta proximidade geográfica, acabei participando de muitas coisas da vida desta minha avó. Estive com ela nos últimos anos em diversos momentos, bons e difíceis. Levei-a diversas vezes ao médico e ao hospital. Visitei todas as vezes que ela ficou internada. Fui a todos os seus aniversários, sagradamente sempre comemorados com um bolinho e diversos salgadinhos no dia 28 de dezembro. Almocei em sua casa. Fui lá comer pizza e bater papo. Tá bom, não com a frequência que talvez ela gostasse, mas fui, e foram momentos ótimos, que guardarei para sempre.

Dona Olinda era uma ótima pessoa, mas tinha uma personalidade muito forte. Para ter uma idéia, nos últimos anos, demitiu quase uma dezena de empregadas que meu pai e meu tio contrataram para ajudá-la. Mesmo com mais de 80 anos, morava sozinha e fazia de tudo em sua casa. Dizia que podia dar conta do recado, que não precisava de ninguém mexendo nas coisas dela ou dando ordens para ela. Apesar disso, a cada duas ou três horas, ligava para o meu pai ou para o meu tio pedindo algo. Uma independência dependente de seus filhos, que a amaram muito e fizeram de tudo por ela.

Lembro que quando eu era pequeno, ela morava num apartamento junto com meu avô. Um apartamento todo arrumadinho, onde sempre tinha bala num pote sobre a mesinha de centro. Aliás, bala nunca faltou na casa da minha avó. Nos aniversários dela ou do meu vô, sempre tinha bolo, festa, comemoração. Dona Olinda tinha uma mão maravilhosa para cozinhar. Fazia gnocchi e capelletti na mão, um por um. O que eu mais amava era um bolinho de batata recheado com carne. Meu Deus! Que coisa maravilhosa, só de lembrar consigo sentir o sabor na boca e a saliva surge…

No meu casamento, ela estava lá. Toda linda. Com 87 anos de idade, fez até prova de maquiagem e cabelo. Isso porque era só um almoço. Ela estava feliz, muito feliz. Comeu muito, deu risada, nem sentiu a tal da dor na cabeça que a assombrava ha anos e tirava seu sossego. Tenho algumas fotos dela neste dia irradiante. Até revelamos uma e demos para ela, num porta-retrato, que até ontem estava sobre a sua mesinha na sala.

Ela adorava conversar. Eu ficava ali, ouvindo suas historias enquanto ela falava do passado, contava do meu pai, dos meus tios, do meu avô. E eu sempre ouvia, perguntava. Era o que ela queria, alguém para bater papo. Ela odiava que eu mexesse no seu cabelo. E eu, para azucrinar, mexia. Bagunçava tudo, e as vezes ela ficava brava. No fundo, acho que ela gostava da minha pentelhação. Nos últimos anos, a beijava sempre e dizia que a amava, toda vez que eu ia embora. E ela sempre dizendo que rezava por mim… Coisa boa.

Mas Dona Olinda se foi nesta terça. E como não acredito em coincidências, sei que ela sabia que iria. Quando a vi na última sexta-feira no hospital, ela repetiu diversas vezes que iria embora do hospital na terça-feira. Meu pai e meu tio a corrigiam, dizendo que seria quarta ou quinta, que era o prazo que o médico tinha dado realmente. E ela repetia: "eu vou embora na terça". E ela realmente se foi na terça...

Agora ela deve estar lá com o meu avô, o Seu Aldo, um filho de italiano que adorava o Palmeiras e tinha uma mão maravilhosa para fazer artesanato (assim como meu pai). Ela sentia saudade do meu avô. Sempre falava dele com muito carinho. Dava para ver e sentir a falta que ele fazia para ela. Também pudera, ela passou a vida inteira ao seu lado.

Sentirei falta da sua voz, da sua comida, da sua companhia. Até do grito de “Alo!” que ela dava no telefone, já que não escutava tão bem assim nos últimos anos. A conversa sempre era em alto e bom som (e estou falando literalmente desta vez).

Dona Olinda foi e ficou um pequeno buraco, mas também uma certeza de que ela está em um lugar bem melhor, sem dores e feliz, ao lado do homem da vida dela, olhando por todos nós. Como disse uma amiga minha, a tristeza naturalmente vai passar. Naturalmente. E o que fica são as boas lembranças e a saudade.

E eu aqui, a quilômetros e quilômetros de distância de todos estes acontecimentos, acompanhando tudo por telefone e Voip, triste mas com a certeza de que, no fim, o que sobra são apenas as experiências que vivemos, boas e ruins, e estas ninguém pode por a mão. São minhas, só minhas e de mais ninguém, guardadas a sete chaves nesta cabeça e neste coração. Isso talvez seja o que costumamos chamar de vida. E a minha teve esta participação mais do que especial.

Bom descanso, minha linda Olinda. Você merece.